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Comunicar ciência

Um blogue sobre comunicação de ciência em linguagem clara (antigo "Estrada para Damasco")

Olhar e não ver as plantas – o estranho caso da cegueira botânica

09.04.20 | Cristina Nobre Soares

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A Francisca Aguiar foi uma das alunas da 3ª edição do curso "Comunicar Ciência Clara". É doutorada em Engenharia Florestal, Professora do Instituto Superior de Agronomia (ISA) da Universidade de Lisboa e Investigadora no Centro de Estudos Florestal, também do ISA . O seu texto final foi sobre um estranho fenómeno que parece que "ataca" muitos de nós: a cegueira botânica.

 

"Sabe que árvores estão na praceta do seu bairro? Ah, então já reparou que a Primavera chegou e algumas árvores do seu bairro estão a cobrir-se de flores de cor carmim. São olaias, também chamadas de árvores-do-amor, por causa das folhas em forma de coração.

Bem… as olaias têm folhas reniformes, isto é, em forma de rim, diriam os botânicos, que estudam as características das plantas, as suas estruturas e funcionamento.

Mas há quem nem sequer as veja. Uma espécie de cegueira: cegueira às plantas. Oito palavras de José Saramago no seu romance “Ensaio sobre a Cegueira” podem ajudar: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”. Mas, note que não é preciso reparar que uma folha de olaia tem a forma de um rim, quando para nós tem a forma de um coração!

Por falar em coração, uma das razões para a incapacidade em reparar nas plantas está relacionada com a emoção. Mas não tenha problemas de consciência. O olho humano tem mais dificuldade em reparar em seres vivos que, à primeira vista, não se movem, não se distinguem e não são ameaçadores. A massa de todas as plantas terrestres equivale a 90 milhares de milhões de elefantes. Já a massa de todos os animais que existem na Terra equivalem a 400 milhões de elefantes. Uma grande diferença, não é?

O estranho caso da cegueira às plantas acontece com vários graus de intensidade e tipos. Há quem só veja o verde, há quem só veja as plantas quando elas estão em flor ou quando estão no prato, e há quem não lhes dê a importância devida no mundo que nos rodeia. Já com os animais não acontece o mesmo. Quem nunca parou ao ver uma borboleta mais colorida, uma joaninha, ou um documentário sobre animais selvagens? É também mais comum adoptar um animal numa Reserva ou Jardim Zoológico do que uma planta.

Mas não se trata de ver quem vence na conquista pelo afecto humano. É antes um tomar de consciência sobre a importância da natureza. A melhor convivência entre humanos, plantas e animais é influenciada por factores culturais, emocionais, de idade e até pelo local onde vivemos e trabalhamos.

Há que construir mais memórias - já se perguntou porque continua a adiar aquela visita ao Gerês? Há que conhecer melhor as plantas – sabia que há 31 milhares de plantas com grande utilidade para os seres humanos e muitas mais para estudar e descobrir? Temos também de ser mais curiosos – sabia que há plantas que têm memória e outras que comunicam entre si através de sinais químicos que enviam pelas raízes?

Agora tenho a certeza que quando voltar a ver as olaias do seu bairro vai reparar nas suas folhas em forma de coração e mostrá-las aos seus filhos será uma boa forma de começar a paixão pela botânica."

Foto: Instituto Superior de Agronomia (Olaias)

 

 

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